O economista Joel Pinheiro brindou o público com uma defesa da máquina de guerra imperialista e da submissão dos povos oprimidos do mundo em um artigo à Folha de S.Paulo intitulado Só um país pode trazer a paz ao Oriente Médio, no qual argumenta que o Irã não deve defender sua soberania e que os EUA devem entrar em cena para impor a paz dos cemitérios no conflito aberto. De cara, o autor presenteou os leitores com a seguinte pérola:

“Há uma assimetria na relação Irã-Israel. O Irã deseja o fim de Israel. A recíproca não é verdadeira. Se amanhã o governo iraniano mudasse e os novos mandatários aceitassem a existência de Israel, o conflito cessaria na hora. A recíproca não é verdadeira: mesmo se um governo pacifista vencer em Israel, isso em nada mudaria a linha oficial do regime iraniano de varrê-lo do mapa.”

A falsidade desse primeiro argumento é fácil de ser verificada na história recente da relação entre “Israel” e a Palestina. Através dos Acordos de Oslo, firmados na década de 1990, a ocupação israelense foi reconhecida pelo Fatá, que comandava a OLP. A Autoridade Palestina, fundada depois, reconhece “Israel” como parte do acordo.

Até hoje, porém, “Israel” não reconhece o Estado palestino, contrariando o que a ONU determinou: a existência de dois Estados. Claro que a existência de dois Estados é uma ficção. Isso nunca poderia prosperar e é o que “Israel” demonstrou. “Israel” não está lá para aceitar a existência de um Estado palestino.

“Israel” existe para que nenhuma oposição ao imperialismo prospere na região do Oriente Médio, a principal produtora de petróleo do mundo e uma das principais rotas comerciais do planeta. Jamais aceitou e nem poderia aceitar a existência de um Estado palestino. Desde que a Revolução de 1979 triunfou no Irã, contudo, o Irã também não pode ser mais tolerado por “Israel” por ser um país onde a soberania da população foi afirmada a ferro e fogo por uma revolução que triunfou e venceu a provocação imperialista na forma de uma vitória na guerra contra o Iraque.

O resultado disso é que “Israel”, que até então tinha boas relações com o Irã, passou a ser um inimigo mortal da República Islâmica. Reagindo a essa oposição, a esse conflito aberto sobretudo pelo imperialismo (representado pelo enclave sionista na região), o Irã naturalmente entendeu que não era possível ter uma coexistência pacífica com os países desenvolvidos e, consequentemente, com “Israel”. É isso que está por trás dessa suposta falsa simetria.

É verdade que o Irã deseja o fim de “Israel”, assim como todos que repudiam a ditadura imperialista no mundo, mas é mentira que a recíproca não seja verdadeira. Entre outras coisas, a ditadura sionista existe para acabar com um Irã soberano, sendo essa a sua função.

De uma maneira cínica, Pinheiro reconhece isso quando destaca que se um governo que mudasse a linha do regime iraniano ascendesse, o conflito cessaria na hora. É claro, se o povo iraniano não estiver mais disposto a impedir a opressão do imperialismo, a se afirmar, a defender sua soberania e sua independência, se o Irã voltar a ser governado por uma ditadura como a do Xá Reza Pahlavi que submeta completamente o país aos caprichos do imperialismo, o imperialismo não vai ter mais um opositor no Irã e, consequentemente, não vai ter porque “Israel” atacar o país.

Naturalmente, isso está fora de questão, porque seria um retrocesso absurdo. Só um masoquista poderia defender o retorno da ditadura imperialista sobre o seu país, especialmente após ter provado a liberdade que, a duras penas, foi conquistada com o sangue de mais de um milhão de pessoas na guerra travada entre o Irã e o Iraque, estimulado pelo imperialismo para atacar a revolução islâmica.

“É por isso que o ataque ao Irã consegue um apoio interno muito mais expressivo do que a campanha em Gaza, cuja brutalidade já passou de qualquer limite. Numa pesquisa da Universidade Tel Aviv publicada no domingo, 83% da população judaica israelense apoia os ataques ao Irã.”

Aqui, Pinheiro já parte para um golpe. Primeiro que não dá para testar a lisura de uma pesquisa de opinião em condições normais. Em “Israel”, menos ainda, pois se trata de uma ditadura que está impedindo a população de registrar o que está acontecendo no país para evitar a desmoralização do regime.

Com essas considerações e fazendo um grande favor de tomar como verdade que 83% da população israelense apoia os ataques contra o Irã, é preciso lembrar que esse resultado foi dado no domingo (15). Hoje, é muito possível que a coisa seja totalmente diferente.

O autor não entra no mérito, mas o fato é que a própria imprensa israelense está reconhecendo que os serviços de apoio psicológico tiveram um crescimento no seu atendimento em “Israel” de 350% no intervalo de apenas cinco dias. A população israelense não está acostumada com esse nível de retaliações que está enfrentando agora e tampouco tem uma ligação real com o território para se importar tanto a ponto de resolver lutar.

Não por acaso, a população israelense foi impedida de abandonar o “país” pela ditadura sionista. A única consequência de toda essa conjuntura é que, se em algum momento existiu todo esse apoio, ele já evaporou. Se tratando de uma sociedade onde quase todo mundo tem dupla cidadania, é bem possível que, num curto intervalo de tempo, uma pesquisa similar aponte algo perto de zero, conforme os acontecimentos demonstrem uma coisa muito óbvia a essa altura: que “Israel” deu uma dentada muito maior do que a barriga ao atacar o Irã.

“Nos últimos meses, conforme Israel atacava inclusive o território iraniano, a resposta iraniana, embora sempre anunciada em termos duríssimos, foi pífia. O Irã teme mais o confronto do que Israel. Se, contudo, ele desenvolvesse bombas nucleares, isso poderia mudar.”

Eis que do golpe, Pinheiro passa para a mentira escancarada. Não é verdade que as respostas do Irã foram pífias, muito pelo contrário. O objetivo do regime iraniano sempre foi o de assustar “Israel” e isso foi conquistado. Tanto é que, depois da operação Promessa Cumprida 2, os sionistas pararam de atacar o Irã.

Pinheiro foge desse fenômeno, mas das duas provocações que “Israel” fez, todas tiveram respostas muito claras do Irã. Até a loucura da sexta-feira (13), “Israel” demonstrou ter entendido o recado. O que mudou agora foi o tamanho da crise que o país enfrentava, que obrigou a ditadura sionista a entrar em um globo da morte, onde eles precisam acelerar sempre. Parar nesse momento significaria a ruína do governo e, talvez, do Estado.

O mundo viu um exemplo disso quando, no começo do governo Trump, o cessar-fogo firmado entre “Israel” e os palestinos quase levou à queda do governo Netaniahu, provocou uma divisão profunda na sociedade israelense. O perigo disso é que o atual primeiro-ministro sionista é o único que consegue dar alguma coesão não só para o governo, mas para a sociedade israelense, de modo que o fim do seu governo teria consequências catastróficas para “Israel”, o que foi reconhecido tanto pelos israelenses quanto pelos norte-americanos, que aceitaram sua volta depois dele ser derrubado do governo no começo da década.

“Hoje os EUA viraram espectadores passivos dos conflitos globais. Apoiam Israel, mas deixam que ele faça o que quiser. Algum acordo que ponha fim ao conflito exigirá que coloquem limites a Netanyahu, mesmo que isso prejudique as ambições dos extremistas de seu governo. Quando os EUA se ausentam da política internacional, o resultado não é a harmonia entre os povos, e sim a guerra sem fim.”

Depois de todas as manipulações e falsificações, finalmente chegamos ao ponto central do que Pinheiro realmente quer, que é a presença dos Estados Unidos na guerra. Ele defende que os Estados Unidos coloque o terror imperialista a serviço da coação do Irã, para que o país ceda e atire na lata do lixo a soberania conquistada pela Revolução de 1979. Traduzindo em miúdos, trata-se de um malabarismo retórico mal feito para defender a ditadura imperialista contra a humanidade.

É fato que a tentativa de um oprimido de se libertar da opressão vai gerar um conflito com os opressores, que dependem do vampirismo. Isso é o que desencadeia as guerras que estouram na Ásia nesse momento, especialmente no Oriente Próximo, onde os palestinos, os povos árabes e o povo iraniano demonstram que não estão mais dispostos a aceitar a opressão histórica imposta a eles pelo imperialismo.

O que Pinheiro está defendendo aqui, portanto, é que os EUA disciplinem esses povos, dando estabilidade ao regime imperialista, que nem por acaso pode ser confundida com um sistema de paz, de harmonia, mas com uma ditadura terrorista que submeta todos ao terror dos monopólios internacionais, o que felizmente não está posto no momento. A própria sociedade norte-americana já deixou claro que não aguenta mais a manutenção do que Trump chamou de guerras eternas, isso inclusive está na raiz da eleição do atual presidente norte-americano que expressa essa desagregação social provocada pela imperialismo, inclusive nos Estados Unidos e nos outros países imperialistas também.

É preciso que a esquerda fique atenta com essas posições que parecem apelar para um pacifismo, para um entendimento harmônico entre povos distintos, quando, na verdade, estão defendendo o fim da soberania dos países atrasados, a submissão de todos os povos a uma ditadura sanguinária, cruel e altamente fundamentada num terror cujas proporções podem ser vistas agora em Gaza. Contra isso, a esquerda deve apoiar o Irã, especialmente em um momento no qual a direita vai para o tudo ou nada contra as forças de contestação da ditadura mundial, defendendo inclusive as piores loucuras do imperialismo.

A República Islâmica deve ser apoiada com todas as forças, assim como o Hamas e as demais organizações da Resistência Palestina, e a resistência armada de todos os povos oprimidos do mundo contra esses opressores. Só a força dos trabalhadores pode pôr fim a essa ordem ditatorial altamente nociva para os povos oprimidos do mundo, inclusive nociva para os próprios povos dos países desenvolvidos, como o povo norte-americano e dos povos europeus, que também são submetidos ao regime de terror imperialista dedicado a manter a coesão interna desses países.

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Last Update: 20/06/2025