O jornal imperialista Folha de S.Paulo publicou nesta semana uma entrevista com um suposto “opositor iraniano” não identificado, que defendeu abertamente a volta de Donald Trump à presidência dos EUA como forma de “mudar o regime” no Irã. Sem jamais ter escondido sua simpatia por políticas intervencionistas no Oriente Médio, a golpista Folha ofereceu espaço privilegiado a um representante da velha guarda monarquista iraniana, cujo programa não passa de um eco das cabeças dos monopólios. Questionado sobre a existência de uma “caça às bruxas” na República Islâmica, eis as considerações do entrevistado anônimo:

Sim, mas não da maneira que as pessoas podem imaginar. O regime não precisou ir de porta em porta prendendo pessoas desta vez. Eles fizeram o que sempre fazem quando estão com medo: nos cortaram.
A internet foi desacelerada quase imediatamente. As mídias sociais se tornaram quase inutilizáveis. Aplicativos de mensagens foram restritos ou completamente bloqueados. Foi como se tivessem puxado uma cortina digital sobre o país.
É assim que eles controlam a narrativa. Eles não querem que as pessoas falem, organizem-se ou compartilhem seus sentimentos sobre o que aconteceu. Eles sabem muito bem que muitos iranianos apoiaram os ataques, mesmo que não possam dizer em voz alta.
Então, em vez de prender pessoas em massa, eles silenciam a nação inteira. Eles não têm medo apenas das bombas. Eles têm medo das conversas que essas bombas podem gerar.
Estamos prontos. Mas sem um livre fluxo de comunicação e sem apoio de potências externas como os EUA, estamos de mãos atadas. Precisamos de alguém para não apenas enfraquecer o regime, mas para nos ajudar a nos libertar. Alguém que entenda que cortar a cabeça da cobra, de Ali Khamenei, é a única maneira de nos libertar.

Ora, se a redução da velocidade da internet pode ser caracterizada como “caça às bruxas”, que dizer da proibição de registro da destruição provocada pelos mísseis iranianos? Claro que tanto o entrevistado anônimo quanto a Folha convenientemente “esquecem” a medida adotada pela ditadura sionista. Outro momento memorável fica por conta do trecho abaixo, que reproduziremos na íntegra, tanto a pergunta quanto a resposta:

Como vocês receberam os ataques de Israel?
Para ser honesto, muitos de nós sentimos algo que não sentíamos há muito tempo: esperança.

O entrevistado não faz questão nenhuma de esconder quão inimigo do próprio país é. Não é difícil compreender que sua trajetória política está longe de representar qualquer movimento popular ou democrático no Irã, defendeu abertamente a política de “pressão máxima” contra o país, que na avaliação do entrevistado, seria mais eficaz do que a tática do ex-presidente Biden, que, ao contrário do que ele retrata, não foi nem perto de pacífico com os iranianos. Não por acaso, essa é exatamente a mesma linha defendida pelo lobby sionista e pelos setores mais reacionários do Partido Republicano nos EUA, que sonham com uma escalada militar contra o Irã.

A Folha, ao invés de questionar os reais interesses por trás desse discurso, tratou a fala do entrevistado como se fosse a voz legítima da oposição iraniana, ignorando completamente o histórico de ingerência imperialista na região e os reais anseios do povo iraniano. Vale lembrar que os mesmos setores que hoje clamam por uma mudança de regime no Irã, foram cúmplices do golpe de Estado de 1953, quando a CIA e o MI6 britânico derrubaram o governo eleito de Mohammad Mossadegh para impor o xá Reza Pahlavi.

O xá, um ditador fantoche, abriu as portas do país às multinacionais do petróleo e reprimiu brutalmente qualquer movimento popular de contestação ao imperialismo. O entrevistado da Folha, que se apresenta como “democrata”, defende justamente essa política, posicionar o Irã como uma cadela dos interesses e dos valores defendidos pelo imperialismo.

O mais revelador, porém, é o silêncio da Folha sobre as conexões do entrevistado com grupos pró-“Israel”. Enquanto o jornal o retrata como um “ativista pela democracia”, omite-se de mencionar seu alinhamento com think tanks e organizações financiadas pelo lobby sionista, que há anos pressionam por uma guerra contra o Irã.

Não é surpresa: a imprensa burguesa brasileira sempre tratou a resistência anti-imperialista no Oriente Médio como organizações “terroristas”, enquanto dá palanque para aqueles que defendem abertamente a violência contra países soberanos. O caso do Irã é emblemático.

Desde a Revolução Islâmica de 1979, o país tem sido alvo de sanções, ameaças e sabotagens por parte dos EUA e seus aliados, justamente por se recusar a se submeter à ditadura imperialista e por apoiar movimentos de resistência na Palestina, no Líbano e no Iêmen. A Folha, ao dar espaço a um defensor da política de “mudança de regime”, mostra mais uma vez seu papel, agindo como se fosse uma caixa de ressonância da propaganda de guerra.

A matéria da Folha é, portanto, mais um capítulo da campanha do imperialismo em âmbito global para justificar uma eventual escalada militar contra o Irã. Nos últimos anos, vimos o mesmo roteiro sendo aplicado contra a Síria, o Iraque e a Líbia, sempre com resultados catastróficos para os povos desses países.

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Last Update: 20/06/2025