A entrevista infame do chanceler alemão, Friedrich Merz, agradecendo e elogiando Israel por fazer o “trabalho sujo por todos nós”, é um desses momentos históricos de revelação. Uma declaração que será lembrada como prova da degradação moral terminal do chamado “Ocidente coletivo”.

Os comentários foram feitos no dia 17 de junho de 2025, à emissora ZDF, durante o encontro do G7 no Canadá. Merz declarou abertamente seu apoio ao bombardeio israelense contra o Irã, iniciado na madrugada da sexta-feira anterior.

“Este é o trabalho sujo que Israel está fazendo por todos nós. Só posso dizer que tenho o maior respeito pelo fato de que o exército e o governo israelense tiveram a coragem de fazer isso”, afirmou.

Por nós, quem? Pela Alemanha? Pelo Ocidente? Pelo Norte Global?

Enquanto Merz agradecia pelo genocídio, Donald Trump publicava mensagens ordenando a “evacuação imediata” de Teerã, uma cidade de mais de 10 milhões de habitantes. Simultaneamente, Netanyahu falava em “queimar Teerã”.

A ameaça não é retórica. Sob seu comando, o exército israelense já matou, até 11 de junho de 2025, segundo o Ministério da Saúde da Palestina, mais de 55.720 palestinos em Gaza — além de 1.706 israelenses. A ONU estima que 70% dos mortos em áreas residenciais são mulheres e crianças. 80% dos palestinos mortos são civis.

Entre as vítimas estão 180 jornalistas, 120 acadêmicos e 224 trabalhadores humanitários assassinados — 179 deles funcionários da ONU, da UNRWA.

Como é possível que a Alemanha — ou qualquer país — apoie uma catástrofe humanitária dessa magnitude?

As falas de Merz, Trump e Netanyahu mostram, mais uma vez, como o nazismo foi possível. Desumanização, mentira, naturalização da barbárie, culto à morte.

O que explica essa ausência total de empatia? O nome disso é racismo. Racismo no seu sentido mais brutal. Racismo colonial, imperial, supremacista. A mesma lógica que sustentou séculos de pilhagem e dominação, hoje se expressa no genocídio em Gaza, na guerra contra o Irã e no cerco à China, à Rússia, a qualquer povo que se recuse a se ajoelhar.

É o mesmo racismo que define a relação do Ocidente com a China. Quando as potências europeias dominaram cadeias produtivas, acumularam riqueza e impuseram sua ordem ao mundo, isso foi chamado de “progresso”. Agora que a China conquista, com mérito próprio, produtividade, tecnologia, desenvolvimento e soberania, isso vira “ameaça”. Por quê? Porque é insuportável, para as elites ocidentais, ver um povo não branco ocupar os mesmos espaços de soberania que sempre reservaram para si.

Não se trata de democracia, nem de direitos humanos, nem de ordem internacional. O que está em jogo é supremacia racial, imperial e colonial. Isso explica Gaza, o Irã, o cerco à China, à Rússia, e os bloqueios criminosos contra Cuba, Venezuela, Nicarágua e qualquer povo que se levante.

No caso da Alemanha, o que vemos é uma submissão tão humilhante, tão degradante, que só pode ser chamada de psicose.

Quem destruiu a infraestrutura mais estratégica da Alemanha no século XXI, os gasodutos Nord Stream 1 e 2?

Não foi o Irã. Foram os Estados Unidos. E a Alemanha sequer teve coragem de exigir uma investigação. Aceitou, de cabeça baixa, o prejuízo e a humilhação.

Quem mentiu para o mundo, prometendo que a Otan não se expandiria até as fronteiras da Rússia — mentira fartamente documentada — e, rompendo essa promessa, produziu a guerra que já matou mais de 500 mil pessoas na Ucrânia?

Foi a Rússia? Ou foram os Estados Unidos e seus satélites europeus?

Agora, Israel ataca o Irã com base nas mesmas mentiras que destruíram o Iraque, a Líbia, a Síria e o Afeganistão. A acusação de que o Irã estaria construindo armas nucleares foi desmentida até pela própria inteligência dos EUA.

Em março de 2025, Tulsi Gabbard, diretora nacional de Inteligência dos EUA, declarou sob juramento no Congresso que o Irã não possui programa nuclear desde 2003.

Nem Israel, nem Estados Unidos, nem qualquer agência internacional apresentou uma única evidência concreta.

Já vimos esse filme.

No Iraque, mais de 1 milhão de mortos. Na Líbia, mais de 500 mil. No Afeganistão, 240 mil. Na Síria, 600 mil. No Iêmen, 400 mil. Mortos por guerras que não têm nada a ver com democracia, direitos humanos ou segurança. Tem a ver com pilhagem, controle e dominação.

O custo dessas guerras ultrapassa 8 trilhões de dólares — dinheiro queimado na destruição de países, na morte de milhões e na fabricação permanente de refugiados e miséria.

Vamos aceitar que isso se repita?

Logo nos primeiros ataques, Israel assassinou os negociadores iranianos que dialogavam com os americanos sobre o programa nuclear. Isso não é coincidência. É método. Israel e os EUA não querem paz. Querem guerra. Querem destruição.

O caso do Irã é cristalino. A literatura sobre o golpe de 1953, organizado pela CIA e pelo MI6, que derrubou Mohammad Mossadegh e instalou uma ditadura pró-ocidental, é pública, vasta e irrefutável.

Não é possível que a opinião pública ocidental permaneça calada.

A paz precisa ser preservada.

Não há qualquer evidência de que o Irã esteja produzindo armas nucleares. E nós já sabemos, por experiência recente, o que acontece quando o Ocidente fabrica mentiras para justificar guerras. Foi assim no Iraque. Foi assim na Líbia. Foi assim na Síria. Sempre é assim.

Não é aceitável que a vassalagem europeia leve suas lideranças, sua imprensa, suas universidades e seus intelectuais à degradação moral absoluta. Como é possível ignorarem todas as denúncias das maiores organizações humanitárias do mundo? Ignorar não só as denúncias, mas os fatos? O assassinato deliberado de trabalhadores humanitários, de funcionários da ONU, da UNRWA, da Cruz Vermelha, de Médicos Sem Fronteiras? Como é possível ignorar o assassinato de 180 jornalistas? Ignorar a destruição sistemática de hospitais, universidades, escolas, centros culturais? Como é possível normalizar a militarização da distribuição de alimentos, agora feita por organizações privadas, armadas, que, em vez de distribuir comida, bombardeiam e atiram em palestinos famintos que buscam comida?

O povo iraniano precisa ser protegido dessa monstruosidade. Já não basta o genocídio aberto e transmitido ao vivo que está acontecendo em Gaza — e que só se agrava.

Qual é a moral de Israel hoje? Depois de massacrar mais de 55 mil pessoas em Gaza, de matar mais de 20 mil crianças, de destruir universidades, hospitais, bibliotecas, de assassinar funcionários da ONU, jornalistas, médicos, professores e de transformar a distribuição de comida em mais um campo de extermínio?

Não é possível que as lideranças europeias não vejam o que acontece nos Estados Unidos — um governo que ataca sua própria Constituição, que promove milícias fascistas, que ameaça juízes, jornalistas, opositores, que destrói seu próprio regime democrático.

É essa a moral que a Europa vai defender? Uma guerra contra o Irã, sustentada pela mesma propaganda anti-iraniana reciclada há décadas, enquanto o próprio império que lidera essa guerra apodrece, corroído por dentro, em colapso moral, institucional e político?

Não é possível que ignorem que suas próprias populações estão nas ruas — milhões — protestando contra o genocídio em Gaza, contra a guerra, contra o massacre. Não é possível que não vejam que a moral de Israel está destruída, e que essa guerra contra o Irã é uma tentativa desesperada de Israel e dos Estados Unidos de impor, à força, uma ordem internacional que já não se sustenta nem econômica, nem política, nem moralmente.

Não é possível que permitam que essa barbárie se repita.

A barbárie hoje não está no Irã. A barbárie está nas lideranças políticas dos Estados Unidos e da Europa. É ali que está a máquina da morte.

Mais uma vez, está claro que o bom senso, a racionalidade e a esperança da humanidade residem hoje no Sul Global.

As declarações dos chefes de Estado do Sul Global — de Lula, de Xi Jinping, de Narendra Modi, de Cyril Ramaphosa, entre outros — são, quase sempre, pela paz, pelo multilateralismo, pela soberania, pela negociação, pela igualdade entre os povos.

Salvo algumas exceções humilhantes, como o atual governo da Argentina, ajoelhado à narrativa fascista de Trump, cumprindo um papel lamentável na história da América do Sul.

É no Sul Global que está, hoje, a resistência civilizatória da humanidade.

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Last Update: 17/06/2025