Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa – Foto: Reprodução

Alguém chega de fora e apalpa, como os cegos apalpavam o elefante da parábola indiana, os participantes de suas reuniões de militares de alta patente acontecidas no final de 2022 no Brasil.

Apalpariam a tromba de um, o rabo de outro, as patas de outro mais, até que, dependendo do que sentissem, poderiam concluir: um é claramente um golpista, outro é legalista e aquele outro é em cima do muro.

Um quarto elefante, ou melhor, o quarto militar, o maior de todos, era o chefe deles e induziria os comandados a parecerem o que, na verdade, não eram ou não queriam ser.

Os militares-elefantes são os participantes de duas reuniões, nos dias 7 e 14 de dezembro. Um deles, o maior, o líder, o ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira, induziria os demais a serem golpistas, sob as ordens do comandante-em-chefe Bolsonaro.

Dos outros três, um já havia aderido à ideia: o chefe da Marinha, Almir Garnier. Outro, o chefe da Aeronáutica, Baptista Júnior, era propenso a ser golpista, porque bolsonarista, mas saltou fora na última hora. E o último, o chefe do Exército, Freire Gomes, era legalista.

O ex-comandante da Marinha Almir Garnier – Foto: Reprodução

Apalpando trombas, rabos, patas e orelhas, não de um, mas de quatro elefantes, cada cego teria a sua percepção de quem eram os apalpados lá em 2022. Hoje, se fizessem nova reunião, com todos eles trocando acusações entre si, tudo ficaria confuso de novo.

Foi o que aconteceu nos interrogatórios dos últimos dias, com testemunhas e réus da tentativa de golpe. Os quatro militares-elefantes já não são tanto o que pareciam ser lá no final de 2022.

O tempo passou e a trama do golpe, que os separou, confundiu tudo. Dois, Freire Gomes e Baptista, acusam os outros de terem conspirado. Os dois acusados, Nogueira e Garnier, asseguram que nunca fizeram nada disso.

Nogueira chega a dizer hoje que trabalhou pelo fim das fissuras entre eles, para que a coesão entre os militares fosse preservada. Mas, se fossem de novo apalpados, os elefantes-militares poderiam ser vistos hoje como outros bichos no cenário pós-golpe fracassado.

O balanço que fica dessa confusão entre o que cada um representou na armação golpista foi exposto no mural de horrores dos interrogatórios no STF.

Baptista acusando Freire Gomes de ter avisado Bolsonaro de que seria preso, se tentasse o golpe. Freire Gomes dizendo que nunca disse nada disso e que não prenderia ninguém. Garnier apontando Baptista como um carreirista que só pensava nele, fechado em mordomias.

E Nogueira assegurando, como disse no depoimento no Supremo, que lutava por todos eles pela democracia, mesmo que, pelo tamanho das presas, fosse claramente um golpista lá no final de 2022.

O que fica dos depoimentos dos quatro militares, todos graduados nos mais altos cargos para fardados no governo de Bolsonaro, é que eles também apalpavam uns aos outros, durante as manobras do golpe, para tentar saber o que cada um deles era.

Sabe-se hoje que eram inconfiáveis entre eles mesmos. Que se viam como possíveis traidores. Que pregavam a boa convivência e o respeito às hierarquias, mas praticavam pouco do que defendiam.

Os depoimentos dos chefes militares de Bolsonaro expuseram ainda mais a degradação das Forças Armadas, rachadas ao meio por uma estrutura fascista em que as partes, da cabeça ao rabo, formavam uma aberração que nem a ditadura foi capaz de gerar.

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Last Update: 11/06/2025