No segundo dia da visita de Estado que realiza à França, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou de um fórum econômico para 500 empresários dos dois países, em Paris. Ele defendeu o aumento do fluxo das transações com o país europeu e comparou o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia à recente vitória do PSG (Paris Saint-Germain) na Liga dos Campões.

Em discurso de uma hora, marcado por falas de improviso, no encerramento do evento, Lula contou ter dito ao presidente francês, Emmanuel Macron, que a conquista da equipe parisiense contra o Internazionale, no último sábado, representa “uma lição” também na política.

“Ela nos ensina  que, na política, não existe saída mágica, a saída individual. (…) Esse time do Paris Saint-Germain, que foi campeão da Champions, os outros jogadores juntos ganham menos do que ganhavam Mbappé, Messi e Neymar, numa demonstração de que no futebol e na política, o conjunto vale muito mais do que a soma individual”, alegou.

Em outro momento, reiterou a promessa de ver o tratado comercial ratificado pelos dois blocos durante o seu mandato na presidência rotativa do Mercosul, de julho a dezembro. A França lidera um grupo de países que se opõem à ratificação do tratado, negociado há 25 anos e que criaria um mercado comum de 722 milhões de consumidores.

“É uma demonstração a quem está tentando derrotar o multilateralismo, a quem está tentando voltar a fazer o protecionismo de que o mundo não quer xerife. O mundo não tem dono”, argumentou. “Por isso eu vou tirar proveito da minha relação de amizade com Macron e vou toda semana ligar: Macron, Macron, Macron, meu amigo Macron, meu companheiro, vamos fazer negócio,  Macron”, brincou.

No comércio bilateral com a França, Lula considerou o fluxo atual, de menos de 10 bilhões de dólares, “uma vergonha”, e reiterou a intenção de elevar as cifras “à altura da parceria estratégica” com Paris. “É muito baixo. O Brasil com o Vietnã já tem 13 bilhões de dólares. Então, vocês, empresários franceses e vocês, empresários brasileiros, tratem de trabalhar. Vamos sair daqui lançando um plano de meta. No próximo dez anos vamos chegar a 20 bilhões de dólares e trabalhar para isso”, disse.

Em paralelo, o presidente antecipou que pretende continuar a agenda intensa de viagens internacionais para ampliar as transações comerciais com outros países. As próximas etapas seriam Índia, Egito e Indonésia. “Só aí, são 1,7 bilhão de habitantes. Então, quem quiser vender, se prepare, porque o que não falta é consumidor”, indicou.

Às lideranças empresariais brasileiras e francesas, no hotel Intercontinental de Paris, Lula também disse duvidar das projeções “pessimistas nos mercados internacionais” sobre o crescimento econômico do Brasil, e defendeu a ampliação do crédito para as famílias de baixa renda.

“Quando você coloca dinheiro na mão do povo, mesmo que seja pouco, aquele dinheiro volta para o mercado imediatamente. Dinheiro não pode ficar no Banco Central. Ficar nos bancos? Não. O dinheiro tem que circular na mão das pessoas”, argumentou. “No meu país, muita gente acha que para controlar o déficit fiscal você não precisa dar aumento do salário mínimo. O mínimo é o mínimo. Como é que você pode cortar o aumento do mínimo?”, questionou.

100 bilhões de reais em investimentos franceses

Durante a tarde, Lula reuniu-se com alguns dos maiores empresários franceses, como o CEO da Total Energies, o presidente do Conselho de Administração da Engie, Jean-Pierre Clamadieu, e o presidente da Schneider Electric, Jean Pascal Tricoire, entre outros. Ao final do encontro, foram anunciados 100 bilhões de reais em investimentos franceses no Brasil em cinco anos, a partir de 2026. Os detalhes não foram revelados.

“Os maiores grupos franceses estão no Brasil. Eles afirmaram que vão fazer 100 bilhões de reais em investimentos nos próximos cinco anos”, anunciou o presidente da Apex-Brasil, Jorge Viana. “A amizade ajuda a abrir portas, e o presidente Lula já vive isso há muito tempo com outros presidentes, mas tem uma sinergia muito maior com presidente Macron”, frisou Viana à RFI, horas antes. “É a primeira visita em 13 anos que um chefe de Estado faz à França com uma agenda intensa e com extraordinários resultados.”

A França ocupa a terceira posição no ranking de investimentos diretos estrangeiros no Brasil, mas tanto Brasília quanto Paris lamentaram que o comércio entre os dois países tenham caído na última década.

“As trocas não estão ao nível do nosso potencial: oscilam entre 9 bilhões e 10 bilhões de dólares. É insuficiente”, disse o ministro francês encarregado do Comércio Exterior, Laurent Saint-Martin. Ele salientou que 1,3 mil empresas francesas estão presentes no Brasil, nos mais variados setores – entre elas, 39 das 40 cotadas na Bolsa de Paris.

”Eu sei que alguns acordos poderiam acelerar as nossas trocas, se conseguirmos atingir todas as condições, e aumentaríamos significativamente o nosso comércio”, comentou, em referência ao acordo Mercosul-UE.

Certificação da pecuária deve abrir mercados ao Brasil

À margem do fórum empresarial, nesta tarde o Brasil recebeu da Organização Mundial de Saúde Animal, com sede em Paris, a certificação de país livre de febre aftosa sem vacinação. O reconhecimento abrange todas as regiões produtoras e é considerado um marco “histórico” para a pecuária brasileira, na definição do ministro da Agricultura Carlos Fávaro.

O País combateu a doença bovina por mais de 60 anos. A certificação tem potencial de abrir para a carne brasileira os mercados mais exigentes em exigências sanitárias, como o do Japão.

“A partir de hoje, o Brasil entra para o hall dos melhores países do mundo em sanidade animal”, celebrou Fávaro.

Presente na cerimônia, Lula ressaltou o peso do setor para a economia brasileira. “Não é um quebra-galho trabalhar com o agronegócio no Brasil: virou o principal negócio do Brasil”, disse o presidente. “Uma coisa é trabalhar para agradar apenas aqueles de dentro da nossa casa. Outra coisa é a gente tentar ganhar o mundo, e trabalhar para convencer pessoas que muitas vezes pessoas nem conhecem o Brasil e os produtores, e muitas vezes são competidores conosco, e colocam exigências que nós achamos absurdas, mas nós cumprimos”, explicou Lula. “O que vocês fizeram é dar uma demonstração de que a gente não é melhor do que ninguém, mas a gente não é pior. No mínimo, a gente quer ser igual àquele que pensa que é o melhor.”

À plateia de lideranças do setor, e diante da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o presidente salientou a importância de o agronegócio “cuidar do meio ambiente”. A pecuária é um dos principais vetores de desmatamento dos biomas brasileiros, em especial a Amazônia e o Cerrado.

”Esta questão climática não é menos. Se a gente tiver pelo menos a decência de cumprir o Acordo de Paris, a gente vai estar livre para continuar produzindo aquilo que a gente quiser”, afirmou Lula. “O Seu Fávaro que trate de incentivar a recuperação de todas as terras degradadas, para que a gente não precise mais derrubar e a gente possa plantar.”

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Last Update: 06/06/2025