A violência política de gênero tem ganhado ares cada vez mais ousados e preocupantes no país. No último sábado (31/5), 25 deputadas estaduais da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) receberam e-mails com ameaças de morte e de estupro. As mensagens com teor altamente violento e ofensivo foram direcionadas às parlamentares tanto de direita quanto de esquerda.
O episódio configura mais um caso de violência política de gênero que choca o país, e ocorreu na mesma semana que ficou marcado com o ataque ao ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, durante audiência no Senado Federal. Isso deixa claro que há uma prática sistêmica de perseguir e atacar mulheres que ocupam espaços de poder e decisão. Nada é por acaso e tudo está interligado. Diversas pesquisas e depoimentos já deixaram claro que há um ecossistema organizado para perseguir mulheres que foram eleitas.
“Nenhuma agressão pode ser tolerada. Por determinação da presidência, as Polícias Civis e Militares foram acionadas e investigam o caso”, disse o presidente da Casa, deputado André do Prado (PL-SP).
Segundo o Uol, a União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais (Unale) repudiou as ameaças de morte e estupro enviadas por e-mail às deputadas: “A Unale se solidariza com as deputadas da Alesp e com todas as mulheres que enfrentam a violência política de gênero. Colocamos-nos à disposição para colaborar com as investigações e para apoiar iniciativas que visem combater e prevenir esse tipo de violência, promovendo um ambiente político mais seguro e inclusivo para todos e inclusivo.”
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Já a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que está investigando um suspeito, de 28 anos de idade, que teve seu computador e telefone celular apreendidos. O caso foi registrado como ameaça, injúria racial e falsa identidade pela Assessoria da Polícia Civil junto à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, informou a Agência Brasil.
Atualmente, a Assembleia Legislativa e São Paulo possui 25 cadeiras ocupadas por mulheres, o que representa 27% do total de 94 parlamentares na Casa. O percentual aponta uma crescente em relação aos anos anteriores. Em 2018, 19 mulheres foram eleitas. Antes, em 2014, apenas 11.
Em postagem em uma rede social, a deputada estadual e Procuradora Especial da Mulher, Ana Perugini (PT-SP), afirmou que as ameaças às 25 deputadas configuram como um ataque ao conjunto do parlamento paulista: “Já passou da hora de, não só organizarmos a segurança em torno de nós, mas de fato chegarmos a quem está promovendo esse tipo de incitação ao ódio, ao crime e, é claro, a um processo que macula o exercício da democracia pelos nossos mandatos. E nós podemos continuar exercendo nosso trabalho aqui em casa sem qualquer medo de fazer aquilo que tem que ser feito.”
A Procuradoria da Mulher da Alesp emitiu uma nota pública condenando as ameaças:
NOTA PÚBLICA DA PROCURADORIA DAS MULHERES DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO
A Procuradoria das Mulheres da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo repudia, com veemência, os atos criminosos praticados pela internet às deputadas estaduais desta Casa.
O ambiente democrático exige respeito, segurança e liberdade para que todas as parlamentares possam exercer plenamente suas funções, sem qualquer tipo de intimidação ou coação.
Salientamos que as medidas cabíveis neste caso estão sendo tomadas.
Deputada Ana Perugini
Procuradora Especial da Mulher
Deputadas Dani Alonso, Paula da Bancada Feminista e Carla Morando
Procuradoras Adjuntas
A deputada estadual Beth Sahão (PT-SP) reforçou em seu perfil no Instagram que a ameaça é configurada como um crime, e que não pode ser tratada como uma brincadeira. Ela destacou que a regulamentação das redes sociais se mostra cada vez mais urgente e necessária.
“É assustador que ainda tenhamos essas práticas criminosas nas redes sociais. A gente precisa que a Casa tome medidas severas e rigorosas no sentido de nos proteger, além de se comprometer a trabalhar no sentido de eliminar essas práticas criminosas que a gente acaba sendo submetida a episódios como este apenas pelo fato de sermos mulheres que ocupam cargos e que estão na política, defendendo suas pautas, e levando adiante aquilo que nós acreditamos e lutamos. E, no entanto, temos que enfrentar esse tipo de ameaça que a gente acreditava que já deveria ter deixado de existir há muitos e muitos anos”, argumentou a companheira.
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Nas redes sociais, a integrante da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo, a deputada estadual Márcia Lia (PT-SP) também expressou sua revolta com o episódio: “A Polícia Civil e a Polícia Federal já foram acionadas, e estão tomando todas as providências. Todas as deputadas terão uma conversa com o presidente desta Casa para que a gente possa coletivamente decidir todas as ações que nós vamos empreender a partir de agora para que a gente identifique o criminoso que fez isso, e que ele seja punido, porque violência política de gênero nesta Casa e nesta Comissão, não.”
A secretária nacional de mulheres do PT, Anne Moura, condenou veementemente as ameaças que as deputadas sofreram, e reforçou, mais uma vez, que o Ministério Público deve atuar de forma mais contundente na apuração das denúncias. Ela defendeu também que é preciso construir uma unidade nacional entre todos os eleitos, seja nas esferas municipal, estadual e federal para cobrar a efetiva aplicação e cumprimento da lei 14.192/2021, que criminaliza a violência política de gênero.
“O que ocorreu com as deputadas estaduais da Alesp deixa cada vez mais nítido que não importa se você é da esquerda, do centro ou da direita, se for mulher, você estará sujeito a ameaças simplesmente pela razão de seu gênero e raça. A misoginia não pode ser naturalizada nesses ambientes. Eu expresso meu apoio e solidariedade aos 25 parlamentares que recebem aquele e-mail experimental com ameaças e ofensas. Cada mulher que ocupa uma carga de poder e decisão é ameaçada, mas a nossa democracia fica fragilizada. Esses homens não seguem impunes. É preciso fazer valer a legislação que criminaliza a prática, e enfrentar esse ódio às mulheres”, defendeu Anne.
Da Redação do Elas por Elas, com informações da Agência Brasil, do UOL e Brasil de Fato