Por Judite Santos
Da Página do MST

A Revolução Cubana traz nas suas entranhas, desde o princípio, as características de uma rebeldia autêntica no sentido de transgredir e rebelar-se contra a ordem social vigente. Assim foi desde a luta anti-colonial, passando pelo processo revolucionário e segue até os dias atuais.

O percurso histórico da situação cubana, agravada pela crise política e econômica no período pré-revolucionário, empurrou o país para um cenário de lutas crescente chegando em seu auge na década de 1950. O levante contra a ditadura de Fulgêncio Batista foi o marco que levou Cuba enfrentar sem tréguas a dominação imperialista até a sua vitória final.

Até este perído Cuba não havia completado sua independência. O país se livrou do domínio colonial direto por parte da Espanha e ficou sob o domínio colonial indireto por parte dos Estados Unidos, após sua intervenção na Guerra Hispano-Americana, de 1898. A transição do regime colonial para o regime semicolonial ou neocolonial foi paulatina. 

De acordo com Florestan Fernandes em sua obra Da Guerrilha ao Socialismo, o neocolonialismo representou uma modernização do antigo sistema que permaneceu intacto ou com pequenas alterações, já que não houve em Cuba, uma transição para o desenvolvimento capitalista de cunho nacional. A nova ordem, pós independência, impôs ao país a sujeição por décadas a um modelo violento de exploração econômica e controle político em benefício dos interesses estadunidense, em detrimento do povo cubano.

As contradições se aprofundaram cada vez mais, levando ao cenário de desestabilização. Após meio século de dominação violenta, crise econômica, anomia social e violência política, a situação tornou-se insustentável. Para Florestan Fernandes, esse conjunto de fatores “imprimiam o caráter potencial explosivo às tensões criadas pela bipolarização e uma intolerância extrema do grosso da população diante das interferências do poder central”.

Na década de 1950, Cuba rebentou as correntes da dominção da herança colonial e transformou o ambiente de insatisfação popular numa revolução emancipatória.

Assim, os ataques simultâneos aos quartéis Moncada, em Santiago de Cuba, e Carlos Manuel de Céspedes, em Bayamo, na madrugada de 26 de julho de 1953, não foi somente o entusiasmo e a coragem de um pouco mais de uma centena de jovens indignados e corajosos, como disse Fidel Castro, décadas mais tarde. O ato foi a culminação das motivações coletivas – fatores objetivos e subjetivos – que empurravam para uma ruptura da velha ordem social.

O assalto ao quartel Moncada foi o desatar do nó dos setores radicalizados que encontraram na insurreição armada o meio para liquidar, definitivamente, com o passado colonial, já que as condições para uma revolução “dentro da ordem” não estava colocada para Cuba. Nas palavras de Florestan Fernandes “o ataque ao quartel Moncada, em 1953, constituiu o marco do novo tipo de insurgência, que irá combinar a ação política rebelde à ação militar organizada”. Neste sentido, Cuba transformou o Moncada num símbolo da luta revolucionária para o mundo. 

Mas as revoluções não caminham sozinhas, é preciso sujeitos, homens e mulheres capazes de conduzi-las. Foi assim que Fidel Castro, Raul Castro, Abel Santamaría, Aydée Santamaria e tantos outros insurrectos lançaram-se na construção do devir revolucionário. Estes jovens canalizaram a rebeldia e, desprovidos de qualquer recurso material, organizaram treinamentos para combatentes ao longo de um ano de trabalho clandestino, para a tomada das fortalezas militares. Mas “o mais difícil do Moncada não era atacá-lo e nem tomá-lo, mas, sim, o gigantesco esforço de organização, preparação, aquisição de recursos e mobilização, em plena clandestinidade, partindo virtualmente do zero”, disse Fidel Castro em 1973, na comemoração aos 20 anos do assalto ao Moncada.

Os recrutados provinham das diferentes camadas da sociedade cubana, eram trabalhadores do campo e da cidade, alguns deles estudantes e profissionais. “Suas mãos foram suficientemente robustas, suas mentes suficientemente saudáveis, seus peitos suficientemente valentes para converterem-se, mais tarde, em estandartes da primeira revolução socialista na América” reiterou Fidel Castro, em 1973.

O Moncada foi uma prova amarga da adversidade. Abel Santamaría e dezenas foram torturados e assassinados, Fidel Castro, Raul Castro e outros caíram presos. Aydée Santamaría e Melba Hernandez, as duas únicas mulheres participantes do assalto, também foram presas. 

A luta travada fora da fortaleza militar naquela madrugada de 26 de julho, impôs aos assaltantes uma amarga, porém pontual, derrota. Esta derrota os ensinou a transformar os contratempos em vitória. Dois anos depois, ainda na clandestinidade, lançou-se o Movimento 26 de julho, instrumento político militar que levou a cabo a luta guerrilheira na Sierra Maestra, através do Exercito Rebelde. Três anos depois, em dezembro de 1956, o Iate Granma, partindo do Golfo México desembarcou 82 expedicionarios, que sob batismo de fogo do exército inimigo, conflagaram a insurreição armada na Sierra Maestra. 

A geração do Moncada alcançou sua vitória pouco mais de cinco anos depois. No dia 1º de janeiro de 1959, anunciou-se o triunfo revolucionário em Santiago de Cuba. O Moncada foi então ocupado pelos mesmos rebeldes de outrora sem disparar um tiro, de tal maneira que “os assassinos aterrorizados viram surgir dos cadáveres heróicos dos homens assassinados em Moncada o espectro vitorioso de suas ideias” conforme aludiu Fidel.

Fidel Castro teve um papel fundamental na direção política do M-26-7 e da Revolução Cubana. Sem sua brilhante liderança, a Revolução Cubana não teria assumido o mesmo percurso histórico e não teria alcançado o patamar de revolução socialista. Fidel dirigiu um movimento de guerra de guerrilhas, cujo objetivo inicial era romper com a ordem social neocolonial, através da derruba do ditador Fulgêncio Batista. Mas foi adiante, transformou o Movimento 26 de julho na vanguarda revolucionária e no pilar da Revolução Socialista. 

A História me Absolverá – discurso de autodefesa proclamado por Fidel perante o tribiunal penal –  transformou-se em um dos documentos políticos mais importantes do M-26J. Além de denunciar os crimes cometidos pelo Estado, o documento expõe as contradições sistêmicas do país e sintetiza as principais medidas revolucionárias como saída para a crise. Neste sentido, A História me Absolverá tornou-se o programa revolucionário, conhecido como “Programa do Moncada”. Condenem-me, não importa. A História me absolverá! tal qual sucedeu: Fidel foi condenado, preso, exilado, comandou o exército rebelde na Sierra Maestra e por mais meio século foi o Comandante-chefe da Revolução Cubana, em nome do Movimento 26 de Julho.

Muitos são os ensinamentos do assalto ao Moncada, por isso celebramos junto ao povo cubano os 72 anos de resistência. O 26 de julho de 1953 representa uma virada histórica, não só para o povo cubano, mas para todos processos de insurreição na segunda metade do século XX, na América Latina e no mundo. A obra da Revolução Cubana transcedeu os limites geográficos, culturais, políticos e finalmente de consicência revolucionária, transformando-se em uma das grandes revoluções socialistas do nosso tempo histórico.

O recrudescimento do bloqueio econômico e das políticas agressivas levado a cabo pelo imperialismo estadunidense até hoje, mantém ativa a capacidade de resistência sempre emanada do próprio povo cubano, que recria cotidianamente sua dinâmica de sobrevivência. O povo defendeu o processo revolucionário nos momentos mais cruciais da sua história, como por exemplo o “período especial” vivido no inicio dos anos de 1990. 

Atualmente, com a brutal política de hostilidade de Washington, na qual se restabelece diretrizes mais rigorosas de asfixia econômica, comercial e financeira, dentre elas a proibição do turismo de cidadãos estadunidenses para a ilha, a unidade popular e a batalha ideológica em torno do projeto revolucionário tem sido o baluarte para enfrentar a nova ofensiva imperialista. 

A Revolução Cubana é de uma grandeza e de uma radicalidade extraordinária, por isso é um exemplo para a humanidade. Esta humanidade em colapso que o capitalismo gerou. 

Cuba fez a Revolução para além do impossível, nas piores condições e não alcançou a completude que queria fazê-la, como dizia nosso querido amigo Fernando Martínez Heredia. Mas Cuba alcançou um horizonte cultural de equidade, solidariedade e justiça social que nenhum país da América Latina foi capaz de alcançar. 

Esta pequena grande ilha recolocou o socialismo no centro do debate da história contemporanea e por isso mesmo está entre as grandes revoluções proletárias do século XX. 

A resistência altiva do povo cubano é hoje é um ato de rebeldia.

Viva a Rebeldia Nacional Cubana! Viva o Movimento 26 de Julho!

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Last Update: 26/07/2025