Era para ser só mais um dia de aula. Mas, dentro de uma sala de aula do Colégio Presbiteriano Mackenzie, uma estudante negra ouviu de um colega que era “escrava”. A mesma palavra que seus antepassados ouviram por séculos, agora dita com escárnio dentro de uma das escolas mais tradicionais do país. A jovem bolsista teve uma crise de pânico, foi encontrada no banheiro do colégio com um saco na cabeça e agora está internada. E a instituição, como de costume, silenciou. Não acolheu a vítima, nem tomou providências públicas contra o agressor.

Na mesma semana na Bahia, governada por Jerônimo Rodrigues do PT, quatro meninos negros de 11 anos foram abordados por policiais militares como se fossem criminosos perigosos. Foram forçados a desbloquear os celulares, ameaçados de serem levados “para dar um rolé de viatura” e acusados, sem qualquer prova, de roubo. Tudo isso filmado e exposto como se o sofrimento de crianças negras fosse entretenimento.

Dois episódios recentes. Dois estados diferentes. Um mesmo país. Um mesmo sistema que continua dizendo, dia após dia, que a liberdade e a dignidade ainda não nos pertencem. O que há de comum nesses casos? A certeza de que a abolição assinada em 13 de maio de 1888 não garantiu reparações. Não garantiu terra, moradia, alimentação, renda, emprego, e nem sequer a vida. Quase 140 anos depois, seguimos assistindo à infância negra sendo tratada como ameaça e à juventude negra sendo esmagada nas escolas, nas ruas, nas cadeias, nos manicômios.

Os dados comprovam o que estou dizendo. Desde a promulgação da Lei de Drogas assinada por Lula, em 2006, o encarceramento de jovens negros disparou. Além disso, dados do Atlas da Violência 2024 revelam que, em 2023, 80% das vítimas de homicídios no país eram negras, evidenciando uma violência letal concentrada nessa população. Esses números refletem um sistema penal que atua com critérios seletivos e racistas, perpetuando desigualdades históricas.

Meninas negras são as maiores vítimas de violência sexual no país. Crescem ouvindo que precisam se proteger dos homens, mas não podem contar com o Estado quando são abusadas dentro de casa, nas escolas, nos abrigos. Quando denunciam, muitas vezes são desacreditadas. Quando não denunciam, são culpabilizadas. Quando organizam sua autodefesa, são criminalizadas como terroristas.

Dizem que a escravidão acabou. Mas como acreditar nisso quando uma criança negra de onze anos é ameaçada por policiais apenas por rir? Quando uma jovem negra precisa ser hospitalizada após ser agredida por colegas brancos que não a suportam em um colégio de elite? Quando mães negras enterram seus filhos e ainda são obrigadas a provar que eles eram inocentes?

O 13 de Maio deveria nos lembrar de uma verdade incômoda: a abolição aconteceu, mas parou ali. Não veio acompanhada de terra, de reparação, de dignidade ou justiça. Fomos, e de certa forma ainda somos, perseguidos pelo Estado em um país que segue lucrando com nossa exclusão. Seguimos controlados, vigiados, punidos, não com correntes, mas com fome, com bala, com humilhação.

A abolição foi o primeiro passo para a nossa libertação, que exige o fim de todas as violências que nos cercam: da polícia racista que executa, do sistema judiciário que condena por perfil, da escola que expulsa os nossos, das leis que encarceram nossos filhos com base em critérios racistas.

No capitalismo pós abolição, ganhamos a liberdade de escolher nosso explorador, ou a amargura do desemprego. Um sistema que precisa da nossa miséria para funcionar, porque rebaixa nossos salários com seu racismo e da classe trabalhadora de conjunto. Para atingir uma liberdade plena, a reparação que precisamos exige a abolição do capitalismo.

Por isso, o 13 de Maio não pode ser tratado como um dia de comemoração, mas de denúncia, de memória e de luta. Porque, enquanto houver racismo, estupro, cadeia, desemprego e bala para os nossos, liberdade ainda será um privilégio e não um direito.

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Last Update: 13/05/2025